O campo da avaliação chegou a um momento peculiar. Temos estruturas sofisticadas, metodologias rigorosas e décadas de conhecimento acumulado sobre o que funciona. Ainda assim, a promessa da avaliação – informar melhores decisões, impulsionar aprendizagem, melhorar resultados – permanece amplamente não cumprida nos círculos políticos. Este paradoxo revela algo fundamental: temos abordado a avaliação como um exercício técnico quando ela é, em sua essência, política.
A lacuna persistente entre evidência e ação
Durante anos, a avaliação tem sido conduzida como se existisse num vácuo, separada das realidades confusas do poder, da política e do discurso público. Produzimos relatórios com recomendações que governos encomendam, mas raramente implementam. Geramos evidências que organizações reconhecem, mas têm dificuldade em transformar em ações. Criamos conhecimento que cidadãos não conseguem acessar, muito menos usar para responsabilizar seus líderes.
A resistência às descobertas de avaliação vai além da inércia institucional. Muitas organizações continuam a ver a avaliação como uma ferramenta punitiva em vez de uma oportunidade de aprendizagem. Esta postura defensiva é compreensível – admitir o que não funciona exige uma vulnerabilidade que poucas instituições estão preparadas para abraçar. Mas esta resistência perpetua um ciclo onde a avaliação se torna performática em vez de transformadora.
Cidadãos excluídos de suas próprias evidências
Enquanto isso, os cidadãos – as próprias pessoas cujas vidas são afetadas pelos programas e políticas sendo avaliados – permanecem amplamente excluídos da conversa. A maioria dos relatórios de avaliação é escrita em linguagem técnica para audiências técnicas, armazenada em repositórios digitais que exigem conhecimento especializado para navegar. Quando os cidadãos conseguem acesso às descobertas, frequentemente carecem de mecanismos para se envolver significativamente com a evidência ou influenciar as decisões que se seguem.
Esta exclusão é particularmente preocupante dado nosso cenário informacional atual. Vivemos numa era onde a informação viaja a velocidades sem precedentes, mas muito dela carece de curadoria, verificação ou fontes credíveis. Pesquisa do MIT mostra que notícias falsas se espalham até 10 vezes mais rápido que reportagem verdadeira nas redes sociais, enquanto 66% dos americanos acreditam que 76% ou mais das notícias nas redes sociais são tendenciosas. Neste contexto, a premissa fundamental da tomada de decisão baseada em evidência – que informação de qualidade é valiosa e naturalmente influenciará atores racionais – começa a parecer quase ingênua.
O recuo da cidadania coletiva
O declínio das noções tradicionais de cidadania agrava estes desafios. O ideal de participação cidadã na esfera pública ganhou impulso notável dos anos 1950 aos anos 1980 – exemplificado pela organização comunitária do movimento pelos direitos civis, ativismo liderado por comunidades e a democratização mais ampla do envolvimento cívico. Ainda assim, isso deu lugar a abordagens mais individualistas. Vemos isso no aumento dramático do lobbying corporativo que prioriza interesses estreitos sobre o bem coletivo: na UE, os gastos com lobbying aumentaram dramaticamente a partir de 2012, com empresas de tecnologia sozinhas gastando €113 milhões em 2023.
Enquanto isso, os padrões de envolvimento cívico estão mudando de maneiras reveladoras. Embora o voluntariado formal tenha diminuído significativamente em alguns contextos – com apenas 25% dos adolescentes americanos sendo voluntários em 2015, abaixo dos 28% em 2005, encerrando três décadas de crescente participação cívica entre jovens – há mais na história quando olhamos para o tipo de voluntariado. No Brasil, por exemplo, o voluntariado individual tem substituído o voluntariado institucional, segundo análise de 2018 do IBGE. Isso sugere uma mudança da participação cívica coletiva e organizada para formas mais individualizadas de envolvimento. Os espaços para diálogo coletivo genuíno e participação cívica institucional de fato diminuíram.
Ainda assim, talvez este momento de crise também apresente uma oportunidade para a comunidade de avaliação reimaginar fundamentalmente seu papel.
Reclamando o propósito político da avaliação
Como Carol Weiss observou há décadas, a avaliação opera dentro de contextos políticos que moldam tanto as perguntas feitas quanto o uso das descobertas. Se aceitarmos esta realidade, os avaliadores não podem permanecer observadores neutros fora da disputa política. Devemos nos envolver ativamente na esfera pública, não como defensores de políticas específicas, mas da deliberação informada por evidência.
Isso exige uma mudança de ver os cidadãos como beneficiários passivos de insights de avaliação para reconhecê-los como parceiros essenciais no próprio processo avaliativo. Nos últimos anos tenho trabalhado em diferentes contextos tentando usar formal e informalmente Grupos de Referência de Avaliação para demonstrar como membros da comunidade podem moldar perguntas de avaliação, interpretar descobertas e desenvolver planos de ação. Quando as pessoas participam significativamente na geração de evidência sobre suas próprias vidas, tornam-se investidas em agir sobre essa evidência.
Mas a participação sozinha é insuficiente. Os cidadãos precisam das ferramentas, conhecimento e mecanismos institucionais para transformar evidência em influência. Isso depende de relatórios de avaliação escritos em linguagem acessível, descobertas disseminadas através de canais que as comunidades realmente acessam, e processos formais que conectam evidência à tomada de decisão.
Também exige que os avaliadores desenvolvam o que poderíamos chamar de “literacia política” – uma compreensão de como o poder opera, onde as decisões são tomadas, e como a evidência pode ser estrategicamente empregada para influenciar esses processos. Isso não significa abandonar o rigor ou neutralidade em nossos métodos, mas sim reconhecer que a busca por evidência é inerentemente orientada para a mudança.
As perguntas desconfortáveis que devemos enfrentar
As perguntas que isso levanta não são confortáveis. Como equilibramos a integridade metodológica com as realidades confusas da política? Como mantemos credibilidade enquanto nos envolvemos mais diretamente nos processos políticos? Como garantimos que a evidência sirva a interesses coletivos em vez de partidários?
Não pretendo ter as respostas. Mas acredito que estas são as perguntas certas para nosso campo enfrentar enquanto consideramos o futuro da avaliação. A alternativa – continuar a produzir estudos tecnicamente sólidos mas politicamente irrelevantes – não serve bem a ninguém, muito menos às comunidades cujas vidas dependem das decisões que nossa evidência pode informar.
O caminho adiante exige coragem dos avaliadores para ultrapassar nossas fronteiras tradicionais e sabedoria dos cidadãos para se envolverem construtivamente com evidência complexa. Mais fundamentalmente, exige reconhecer que o habitat natural da avaliação não é a sala de conferências acadêmicas ou o escritório do consultor, mas a praça pública onde cidadãos e líderes negociam o futuro de suas comunidades.
Somente quando criarmos cidadãos verdadeiramente empoderados – pessoas com acesso à evidência, habilidades para interpretá-la e mecanismos para agir sobre ela – a avaliação cumprirá sua promessa de contribuir para melhores decisões e melhores vidas.